Mídia / Jornal Fera

Trabalho obrigatório no SUS é questionado por estudantes e instituições particulares

11/07/2013

A medida que obriga estudantes de medicina a atuar por dois anos no SUS (Sistema Único de Saúde), anunciada nesta segunda-feira (8) como parte do Programa Mais Médicos, tem sido alvo de questionamentos por estudantes e instituições de educação. A obrigatoriedade é vista com ressalvas. Os dois anos a mais antes do diploma e do registro profissional podem ser um desestímulo para os alunos. Quem trabalha no setor diz que é preciso definir bem as regras da exigência para que nem a rede pública e nem os profissionais sejam prejudicados.

Pela medida provisória (MP 621/2013) enviada pelo governo ao Congresso Nacional, a partir de 2015 os alunos de medicina deverão trabalhar por dois anos na atenção básica e na urgência e emergência do SUS, chamado de segundo ciclo. Com isso, o curso passará de seis anos para oito anos de duração. A medida é válida para faculdades públicas e privadas e garante, durante o período, o pagamento de uma bolsa tanto para estudantes quanto para professores tutores.

Para a coordenadora do Núcleo de Estudo em Saúde Pública da UnB (Universidade de Brasília), Maria Fátima de Sousa, a medida proporciona uma ação estruturante necessária ao ensino dos futuros médicos.

— Esses profissionais estão sendo formados para um modelo de saúde que não precisamos mais. Precisamos de médicos generalistas para trabalhar nas comunidades e a formação hoje está dirigida a especialidades, o que precisa ser mudado.

No entanto, há quem diga que os dois anos a mais podem desestimular os candidatos.

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Vitória Gimenes, aluna do quarto semestre de medicina da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), relata que a medida pode ser repetitiva no caso das universidades públicas.

— Nós já temos dois anos de internato [quando o estudante atua em hospitais sob supervisão de um professor] que, no caso das escolas públicas, já são dois anos atuando no SUS.

Pelo texto da MP, os dois anos finais não dispensam o estudante do internato, já previsto nas diretrizes curriculares nacionais.

Vitória não é contra a atuação na saúde pública após os seis anos de formação, mas defende que não seja obrigatório.

— Acho certo trabalhar no SUS, mas não é o ideal ter mais dois anos de obrigatoriedade. Já temos mais quatro anos de residência, são dez anos de formação e estão só aumentando isso.

A estudante do sexto ano de medicina da UFPR (Universidade Federal do Paraná) Regina Vallego diz que, na faculdade, falta prática em urgência e emergência, uma demanda dos estudantes, porém é preciso ver em que condições a nova iniciativa será feita.

— Só porque faltam médicos nessas áreas vão colocar todos os alunos para trabalhar nelas? Será que eles têm condições? O período contará como parte da residência. Será suficiente? Não cairá o nível da residência?.

Regina também contesta a autonomia dos alunos.

— São estudantes, portanto não podem tomar decisões sozinhos, como é possível na residência médica. Esse alunos terão algum poder de decisão ou tudo terá que passar pelo aval do supervisor?

A tutoria é um dos pontos que preocupa as faculdades particulares.

O diretor executivo da Abmes (Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior), Sólon Caldas, defende uma melhor definição do assunto.

— A supervisão está vinculada à instituição de ensino em que o aluno estuda. Tem que ter uma contrapartida para a instituição. Quem vai arcar com esses custos a mais do professor? Isso tem que ser melhor definido. Fica subentendido que o governo quer encontrar um mecanismo para obrigar o médico a prestar serviço para o governo. Temos vários questionamentos sobre esse assunto.

A Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior) não se posicionou sobre a proposta. Na próxima semana, haverá reunião do conselho pleno da entidade, quando o segundo ciclo no ensino médico será discutido. A UNE (União Nacional dos Estudantes) também não tem um posicionamento oficial até o momento, pois avalia a medida.

A MP estabelece que o CNE (Conselho Nacional de Educação) tem 180 dias para regulamentar o trabalho dos alunos no SUS. O conselheiro do CNE José Fernandes de Lima diz que será formada uma comissão para analisar o tema. Serão feitas audiências públicas, além do debate interno na Câmara de Educação Superior. O CNE vai definir as atividades, o número de horas, a relação entre tutor e estudante, a formação do tutor e a relação entre estudante e hospital. As possíveis alterações na MP feitas pelo Congresso Nacional serão consideradas, explica o conselheiro.

As principais entidades médicas do país criticaram a iniciativa do governo.

Nessa quarta-feira (10), o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, disse que o trabalho no SUS vai formar médicos com visão humanista e menos dependentes de máquinas e exames para atender.
Fonte: Veja